Os bebés têm uma necessidade muito grande de
interação. É esta que permite um saudável desenvolvimento. Como as cores, os
movimentos animados e os sons da televisão captam facilmente a atenção dos
bebés, muitas vezes os pais (ou até educadoras nas creches - cerca de 73% das
crianças vê televisão na creche, segundo a Deco) usam-nas como “babysitters”.
A utilização
excessiva da televisão pode comprometer
a capacidade do bebé em explorar o ambiente, comunicar, aprender a distrair-se
sozinho, acalmar-se de forma autónoma, e aprender a brincar – o que mais
tarde pode comprometer o
desenvolvimento da capacidade simbólica, fundamental para a saúde mental da
criança.
A televisão é uma fonte de hiperestimulação desajustada
para os bebés, não só por alguns conteúdos mas principalmente pelos seus
ritmos bem mais acelerados e estimulantes que o ritmo da vida real. O seu uso pode deixar o bebé agitado pela
quantidade de informação que o seu cérebro terá de processar (pois cada imagem
televisiva é constituída por um conjunto de centenas de pontos luminosos). Um
bebé pequeno não consegue acompanhar a velocidade da sequência de imagens, nem
os cortes constantes de luz e de som, sendo estes ansiogénicos. Os bebés
avaliam a sua segurança através dos ritmos, das rotinas, da tranquilidade,
assim, qualquer presença disrítmica,
como a da televisão, será geradora de ansiedade, aumentando o choro e dificultando
o sono.
Um bebé exposto à televisão em excesso poderá apresentar dificuldades em:
- Sentir-se seguro a brincar sozinho, requerendo atenção constante, e
exigindo ser entretido continuamente - pois não aprendeu entreter-se sozinho;
- Desenvolver conquistas físicas próprias da sua idade
sem se frustrar em pouco tempo, apresentando
dificuldades em persistir numa tarefa até conseguir ter resultados;
- Satisfazer-se com apenas um brinquedo, tendo
tendência para estar constantemente a mudar de brinquedo, explorando-os apenas
de forma superficial.
A televisão é uma excelente fonte de entretenimento,
no entanto é fundamental que as crianças possam, desde bebés, desenvolver a
aptidão de entreterem-se por elas mesmas. Esta é uma variável que influencia diretamente o sono. Um bebé
que não sabe estar períodos progressivamente maiores entretido por si,
sentindo-se seguro, terá muito mais dificuldade em adormecer de forma autónoma.
Se for vista televisão imediatamente antes de ir dormir, no momento de adormecer
o bebé/criança terá que lidar com o acalmar da estimulação nervosa (também ao
nível da luminosidade retida na retina) e com a necessidade de processar a
informação (porque o que vê são feixes de luz sem sentido, que lhe vão ocupar o
cérebro e dificultar o trabalho de triagem cerebral que faz durante o sono) - o
que piora a qualidade do sono, tornando-o
mais agitado e com menos capacidade reparadora.
Algumas recomendações
no uso da televisão:
- Os bebés não
devem estar expostos à televisão (de forma regular) antes dos dois anos. Nunca antes do primeiro ano, e antes dos
dois, apenas períodos mínimos (no máximo de dez minutos) e com imagens bem
definidas, com as cores primárias, e com elementos que o bebé conheça na sua
casa ou no seu ambiente.
- A criança pequena não deve ver mais do que uma (a duas) hora(s) diárias e
preferencialmente no período da manhã – ficando neste tempo também incluídos
tablets, computadores e consolas. Os pais devem impor estes limites de forma
clara e sugerir (de forma entusiasmada) alternativas (ler ou ver um livro,
desenhar, brincar sozinho ou com os pais, fazer jogos na rua, fazer desporto,
etc).
- Os pais não
devem usar a televisão como forma de entreter o bebé ou de forma a substituir a interacção.
- A televisão
não deve ser usada para distrair o bebé enquanto chora, pois priva-o de
treinar os mecanismos necessários para saber acalmar-se sozinho.
- As refeições
não devem ser acompanhadas de televisão. É fundamental que os pais
conversem com os filhos. Que se troquem experiências, que se conte como foi o
dia. Também os bebés pequenos não devem ver televisão na hora das refeições
como distração.
- Adequar os
programas à idade da criança e escolher de preferência programas que apelem
à participação (e não à passividade).
- Os pais devem servir
como modelos para os filhos,
selecionando também de forma criteriosa os programas a que assistem.
- A televisão
não deve estar ligada como “ruido de fundo” quando os bebés estão na
divisão.
- As crianças não
devem ter televisão no quarto. A televisão deve estar na sala ou num espaço
comum. É natural que entre irmãos hajam “guerras” pela posse do comando, o que
é uma boa oportunidade para aprender a negociar e fazer cedências.
- Os pais devem
ver televisão com os filhos (sendo ideal os pais visualizarem
antecipadamente o programa), pois as crianças precisam de ajuda na compreensão
de certos conteúdos televisivos (nomeadamente ajuda a distinguir a realidade da
ficção). Os pais devem esclarecer dúvidas e ajudar a interpretar e fomentar o
pensamento crítico.
- Não deve ser
vista televisão antes de ir dormir, como veículo para acalmar. A televisão
é uma fonte de estímulo e distracção, relacionada com actividade e não algo
ajustado para adormecer. É certo que se pode observar um bebé a acalmar ao ver
televisão, mas ao concentrar-se na televisão ele está a distrair-se do mais
importante, que é aprender a acalmar-se autonomamente através da redução de
estímulos.
Não se pode dizer que a televisão é boa ou má, depende
da utilização que lhe for dada. Pode ser
uma fonte de estímulo e de aprendizagem, desde que oferecida a partir da altura
certa, com o conteúdo certo e na “quantidade” adequada. Os programas
infantis devem ser cuidadosamente selecionados pelos pais, devem ser
pedagógicos e adequados à idade da criança. Existem variados canais
programáticos para crianças e cabe aos pais escolherem o melhor de cada um. No
entanto, é importante protegermos as crianças do passivismo de quem apenas é “recipiente de informação”. Para um desenvolvimento saudável é
fundamental saber criar, inventar (brincar!), tal como conseguir articular
mecanismos internos e externos para se manter entretido e tranquilo. Assim, devemos proteger os bebés do entretenimento
híper-estimulante e sem desafio, e ensinar
as crianças a serem consumidoras criteriosas e exigentes e a terem uma
relação saudável com a televisão.
Por Ana Amaro Trindade, Psicóloga Clínica
Carolina N. Albino, Especialista em Ritmos de Sono do Bebé
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