sexta-feira, 16 de maio de 2014

Causas que incentivam e enraízam o despertar na madrugada - Parte II: Pouco (e/ou desajustado) sono diurno

O sono de um bebé deve ser sempre analisado como um todo, mas com dois contextos e ritmos diferentes. O sono diurno – sestas - e o sono da noite.

O sono que o bebé faz durante o dia influencia o sono da noite e muitas vezes essa importância é subestimada com base no mito: “quanto menos dormir durante o dia, melhor vai dormir à noite”. No entanto tal pode ser verdadeiro se o bebé dormir por mais de 3 horas seguidas durante o dia, e dependendo do encaixe dessa sesta no dia, pois isso poderá inverter a noção do bebé acerca do sono da noite e a do dia.

Quando o bebé não está a dormir o que precisa (duração total das sestas), na distribuição ajustada (horário das sestas ao longo do dia) e sob os hábitos adequados durante o dia, o sono da noite, caso ainda não tenha dado sinal, poderá começar a ficar interrompido com despertares a meio da noite. Por vezes sou questionada porque é que nas minhas intervenções no terreno, resolvo os problemas de sono nocturno do bebé, durante o dia, por ser algo curioso para muitos pais. É porque é onde se tem o melhor terreno de aprendizagem e prática em relação à conciliação do sono e mesmo ao readormecer entre ciclos circadianos (de 45 minutos cada). Praticamos de dia, algo a ser implementado de forma contínua durante a noite, sem interrupções demarcadas para atividade e, desde cedo, para alimentação (através de um desmame sólido e seguro).

Assim, o sono do dia é uma preparação diária para a melhoria e consolidação do melhor sono da noite. Para complementar deve haver um conjunto de referências, a par de uma mudança de postura e resposta por parte dos pais, para a distinção do dia da noite, para ajustar a expectativa do bebé, em sintonia com rituais de referenciem o final do dia.

Se o bebé dorme menos do que a sua fase de desenvolvimento físico necessita, ao longo do dia, é algo que se reflectirá num sono mais agitado - com maiores períodos de sono leve durante a noite, e logo maior predisposição para acordar, ou incapacidade de consolidar o sono noturno continuo. Caso o bebé se habitue a dormir menos do que precisa para a idade, durante o dia, poderá dar-se também um acumular de situações indesejadas ao ponto se enraizarem em hábitos: se o bebé ao dormir pouco durante o dia, estará mais propenso a alimentar-se pior (mais sôfrego, ou mais desconcentrado, ou com menos quantidade), assim como a ter tendência para diminuir intervalos entre refeições, a ter mais momentos de choro e rabugice ou mesmo de exaustão, tornando-se muito exigente. Neste caso, todo este acumular tende não só a comprometer a qualidade de sono à noite, como a de potenciar o despertar por fome durante a madrugada, além do reflexo de hiperestimulação diurna. O sono potencia o sono, quanto menos o bebé dormir (do que precisa), mais difícil será o seu sono seguinte.

Obviamente a distribuição do sono diurno é muitíssimo importante, daí que o bebé precise de fazer um ritmo de sono diurno que tempere a estimulação dos momentos de atividade com verdadeira “absorção” de informação, com o modo profundo de processamento, reparação e crescimento, ou seja o dormir. As sestas de tempo ajustado protegem também o seu cérebro de deixar de reter informação de forma qualitativa enquanto acordado, e evitam o empurrar do bebé para estados de desconcentração e aceleramento físico ao ponto de poderem influenciar o seu comportamento a médio e longo prazo (e até o dos pais) e mesmo o seu temperamento.

O bebé só precisa de estar acordado em momentos que possam ser de qualidade para ele, e quando demonstrar sinais de sono, será correcto mudar de ritmo - começar a acalmar - para poder depois aprender a adormecer, e dormir, o tempo ajustado. Claro que só será tão simples caso se encare o sono como uma das aprendizagens mais estruturais do Ser Humano, em idades de rápido crescimento, e possa haver, por parte dos pais, dedicação ao mesmo nível que há para outras aprendizagens importantes. Caso contrário é mais típico que dormir pouco ou mal, se possa tornar um hábito.





quarta-feira, 14 de maio de 2014

Causas que incentivam e enraízam o despertar na madrugada - Parte I

É importante que o sono do bebé não seja analisado como um campo independente a qualquer outro campo relevante da vida do bebé. É preciso coordenação nos hábitos de alimentação, atividade e comportamento. Estes influenciam directamente o sono e vice-versa. Por exemplo: um bebé que não come bem, é um bebé que tendencialmente não dorme bem. Curiosamente o contrário também se verifica. Um bebé que tem actividades desajustadas para a sua capacidade de processamento, seja em duração ou em tipologia, é um bebé que não dorme bem. Curiosamente quando um bebé não dorme o que precisa, os seus momentos estando acordado podem ficar mais desconcentrados e rabugentos. Estes são só alguns exemplos. Para o melhor desenvolvimento e aprendizagem são necessárias as melhores experiências enquanto os bebés estão acordados. As melhores experiências enquanto acordados, precisam da melhor experiencia ao nível do que as agrega e processa - o sono.


Convido-a a conhecer mais acerca do início das causas que fazem o bebé chorar e acordar a meio da noite, e as causas que o fazem enraizar esse despertar num o hábito. Neste artigo analisarei a primeira destas causas: a Fome, nos próximos artigos abordarei as restantes: o pouco sono diurno, o adormecer comprometedor, a rotina desajustada, as repostas dos pais que intensificam estes despertares, a hiperestimulação nas atividades diurnas e as causas ambientais.


 1# Fome:

Porque o corpo está em rápido crescimento, toda a alimentação que não for feita durante o dia o bebé terá tendência para compensar durante a noite. O bebé acordará pelo desconforto da fome, noite após noite e mesmo mês após mês, caso continue impercetível aos olhos dos pais que durante o dia consideram que comeu o suficiente. O bebé está a crescer a uma velocidade incomparável com qualquer outra fase da vida, e como tal, precisa de um aporte calórico capaz de o satisfazer durante as 24h, parte delas a dormir, e por isso mesmo deve ser orientado para se alimentar de forma evolutiva, idealmente durante o dia, pois caso contrário irá comprometer continuamente o sono nocturno, em especial na passagem dos impulsos de crescimento.

A importância de ensinar a comer bem durante o dia é tanta, como a de ajustar os seus ritmos de alimentação à sua idade, numa rotina diurna ajustada. Esta rotina deve contemplar uma ajustada preparação do desmame noturno, sem isso, poderá ser difícil o bebé gradualmente atingir a capacidade de dormir cada vez mais horas sem a necessidade de interromper o sono para se alimentar durante a madrugada. E pode bastar um dia, ou uma refeição com menos quantidade para se revelar num ou vários despertares a chorar durante a noite.


“Impulsos de crescimento”

Normalmente apanham os pais desprevenidos e podem enraizar o hábito de despertar. São surtos de crescimento que provocam um aumento de fome, que duram aproximadamente 3 dias, após as 6-8 semanas (tipicamente o primeiro impulso) e depois podem repetir-se cada mês, ou de 6 em 6 meses aproximadamente. Durante o dia o bebé poderá esboçar esse aumento de fome, ou em sestas mais curtas, mais choro, ou simplesmente um rapar do prato. Se os Pais não estiverem atentos e não tiverem o hábito de oferecer mais alimento nestas circunstâncias, o bebé tenderá a compensar a fome durante a noite (por não a ter satisfeito durante o dia). Se nada se fizer em prevenção (ou seja, durante o dia) podem bastar 3 noites seguidas em que o bebé não pode evitar começar aí mesmo um hábito de despertar àquela hora, mesmo que já não tenha fome, após o impulso de crescimento.


“Intervalos de alimentação diurna não adequados à idade”

Os bebés terão capacidade de aumentar os seus intervalos de alimentação durante o dia, caso estejam a comer o que de facto precisam em cada refeição – se esta for capaz de fornecer energia suficiente para o bebé ter o seu tempo ajustado de atividade e ainda conseguir dormir o tempo ajustado de sono nas suas sestas.

Os intervalos entre refeições não evoluírem poderá advir dos pais inadvertidamente passarem o dia alimentar o bebé, que tendo peso para mais, ingere leite/alimento de pouco em pouco tempo. Depressa o bebé fica adepto de lanchinhos em vez de refeições que o satisfaçam pelo tempo ajustado, isto pode acontecer porque:

- O bebé não se alimenta o suficiente porque os pais não podem controlar nem a quantidade nem a concentração calórica (quando a amamentação não está regulada), daí que não aguente muito tempo;

- Se começou a usar a amamentação como resposta para diferentes causas de choro que não apenas da fome. O bebé passa então a ingerir para comer, dormir, ou para satisfazer qualquer questão de desconforto.

Ambas não vão permitir que o bebé evolua para um aumento de tempo a dormir sem acordar de noite com fome. As necessidades calórico-nutritivas de um bebé devem acompanhar o desenvolvimento em 24h do seu rápido crescimento, e isso fará o bebé ter a necessidade de compensar durante a noite, despertando. Se o seu bebé está a diminuir os intervalos de despertar, por fome, durante a madrugada, será necessário por em questão se a quantidade, a concentração calórica ou os intervalos que faz durante o dia, o permitirão evoluir em maiores tempos de sono continuo. Ninguém espera que nasça com essa capacidade física alcançada, mas evoluirá mais ou menos depressa também dependendo da importância que se der a esta questão. Não faz sentido, nem é benéfico, um bebé de 9 meses fazer um intervalo entre refeições de 2 horas ou mesmo 3h durante o dia. Obrigatoriamente irá ingerir menos e o seu estômago será ajustado a menos quantidade. Se o estômago for menor do que as suas necessidades de desenvolvimento, este bebé poderá ter razões para não aguentar mais de 5/6 a dormir sem despertar por fome durante a noite. As sestas obviamente ficarão igualmente comprometidas.


“Ausência de uma preparação diária para o desmame noturno”

O desmame noturno só estará próximo de acontecer de forma consolidada (e evitando retrocessos), caso se faça essa preparação todos os dias de forma gradual. Muitas vezes acontece que se espera tempo demais para começar essa preparação sólida. Poderá ser já tarde demais porque o bebé já poderá ter enraizado o hábito de acordar, poderá já ter associado algum desconforto ao berço, mesmo nas noites em que acorda sem ser pela razão da fome.

Informo constantemente os pais que não é durante a madrugada que se prepara o trabalho do desmame noturno. É algo preparado de forma proactiva e por parte dos pais, orientando o seu bebé numa rotina e no ensino de bons hábitos de alimentação durante o dia, num “cluster feeding” combinado com sono.

O desmame noturno só pode suceder quando todos os outros campos estão satisfeitas e o bebé naturalmente deixa de acordar por ter fome. Muitas vezes os pais forçam a esta situação, por apenas avaliarem o peso do bebé, desconhecendo que o desmame noturno se conquista através de medidas concretas e proactivas durante o dia, e não numa imposição por parte dos pais durante a noite. O desmame nocturno deve continuar a ser consolidado mesmo depois dessa conquista, para enraizar o hábito de forma segura.


Quando a preparação do desmame nocturno é iniciada desde cedo, o bebé tem hipóteses de consolidar o seu sono de forma contínua na madrugada, pois é a fome a causa inicial para que, enquanto recém-nascido, acorde. Ao ser resolvida, torna-se mais fácil poder intuir todas a outras causas (que abordaremos nos próximos artigos sobre este tema).