sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Os bebés e a televisão - Artigo com a Psicóloga Ana Amaro Trindade


Os bebés têm uma necessidade muito grande de interação. É esta que permite um saudável desenvolvimento. Como as cores, os movimentos animados e os sons da televisão captam facilmente a atenção dos bebés, muitas vezes os pais (ou até educadoras nas creches - cerca de 73% das crianças vê televisão na creche, segundo a Deco) usam-nas como “babysitters”.

A utilização excessiva da televisão pode comprometer a capacidade do bebé em explorar o ambiente, comunicar, aprender a distrair-se sozinho, acalmar-se de forma autónoma, e aprender a brincar – o que mais tarde pode comprometer o desenvolvimento da capacidade simbólica, fundamental para a saúde mental da criança.

A televisão é uma fonte de hiperestimulação desajustada para os bebés, não só por alguns conteúdos mas principalmente pelos seus ritmos bem mais acelerados e estimulantes que o ritmo da vida real. O seu uso pode deixar o bebé agitado pela quantidade de informação que o seu cérebro terá de processar (pois cada imagem televisiva é constituída por um conjunto de centenas de pontos luminosos). Um bebé pequeno não consegue acompanhar a velocidade da sequência de imagens, nem os cortes constantes de luz e de som, sendo estes ansiogénicos. Os bebés avaliam a sua segurança através dos ritmos, das rotinas, da tranquilidade, assim, qualquer presença disrítmica, como a da televisão, será geradora de ansiedade, aumentando o choro e dificultando o sono.

Um bebé exposto à televisão em excesso poderá apresentar dificuldades em:
- Sentir-se seguro a brincar sozinho, requerendo atenção constante, e exigindo ser entretido continuamente - pois não aprendeu entreter-se sozinho;
- Desenvolver conquistas físicas próprias da sua idade sem se frustrar em pouco tempo, apresentando dificuldades em persistir numa tarefa até conseguir ter resultados;
- Satisfazer-se com apenas um brinquedo, tendo tendência para estar constantemente a mudar de brinquedo, explorando-os apenas de forma superficial.

A televisão é uma excelente fonte de entretenimento, no entanto é fundamental que as crianças possam, desde bebés, desenvolver a aptidão de entreterem-se por elas mesmas. Esta é uma variável que influencia diretamente o sono. Um bebé que não sabe estar períodos progressivamente maiores entretido por si, sentindo-se seguro, terá muito mais dificuldade em adormecer de forma autónoma.

Se for vista televisão imediatamente antes de ir dormir, no momento de adormecer o bebé/criança terá que lidar com o acalmar da estimulação nervosa (também ao nível da luminosidade retida na retina) e com a necessidade de processar a informação (porque o que vê são feixes de luz sem sentido, que lhe vão ocupar o cérebro e dificultar o trabalho de triagem cerebral que faz durante o sono) - o que piora a qualidade do sono, tornando-o mais agitado e com menos capacidade reparadora.

Algumas recomendações no uso da televisão:
- Os bebés não devem estar expostos à televisão (de forma regular) antes dos dois anos. Nunca antes do primeiro ano, e antes dos dois, apenas períodos mínimos (no máximo de dez minutos) e com imagens bem definidas, com as cores primárias, e com elementos que o bebé conheça na sua casa ou no seu ambiente.
- A criança pequena não deve ver mais do que uma (a duas) hora(s) diárias e preferencialmente no período da manhã – ficando neste tempo também incluídos tablets, computadores e consolas. Os pais devem impor estes limites de forma clara e sugerir (de forma entusiasmada) alternativas (ler ou ver um livro, desenhar, brincar sozinho ou com os pais, fazer jogos na rua, fazer desporto, etc).
- Os pais não devem usar a televisão como forma de entreter o bebé ou de forma a substituir a interacção.
- A televisão não deve ser usada para distrair o bebé enquanto chora, pois priva-o de treinar os mecanismos necessários para saber acalmar-se sozinho.
- As refeições não devem ser acompanhadas de televisão. É fundamental que os pais conversem com os filhos. Que se troquem experiências, que se conte como foi o dia. Também os bebés pequenos não devem ver televisão na hora das refeições como distração.
- Adequar os programas à idade da criança e escolher de preferência programas que apelem à participação (e não à passividade).
- Os pais devem servir como modelos para os filhos, selecionando também de forma criteriosa os programas a que assistem.
- A televisão não deve estar ligada como “ruido de fundo” quando os bebés estão na divisão.
- As crianças não devem ter televisão no quarto. A televisão deve estar na sala ou num espaço comum. É natural que entre irmãos hajam “guerras” pela posse do comando, o que é uma boa oportunidade para aprender a negociar e fazer cedências.
- Os pais devem ver televisão com os filhos (sendo ideal os pais visualizarem antecipadamente o programa), pois as crianças precisam de ajuda na compreensão de certos conteúdos televisivos (nomeadamente ajuda a distinguir a realidade da ficção). Os pais devem esclarecer dúvidas e ajudar a interpretar e fomentar o pensamento crítico.
- Não deve ser vista televisão antes de ir dormir, como veículo para acalmar. A televisão é uma fonte de estímulo e distracção, relacionada com actividade e não algo ajustado para adormecer. É certo que se pode observar um bebé a acalmar ao ver televisão, mas ao concentrar-se na televisão ele está a distrair-se do mais importante, que é aprender a acalmar-se autonomamente através da redução de estímulos.

Não se pode dizer que a televisão é boa ou má, depende da utilização que lhe for dada. Pode ser uma fonte de estímulo e de aprendizagem, desde que oferecida a partir da altura certa, com o conteúdo certo e na “quantidade” adequada. Os programas infantis devem ser cuidadosamente selecionados pelos pais, devem ser pedagógicos e adequados à idade da criança. Existem variados canais programáticos para crianças e cabe aos pais escolherem o melhor de cada um. No entanto, é importante protegermos as crianças do passivismo de quem apenas é “recipiente de informação”. Para um desenvolvimento saudável é fundamental saber criar, inventar (brincar!), tal como conseguir articular mecanismos internos e externos para se manter entretido e tranquilo. Assim, devemos proteger os bebés do entretenimento híper-estimulante e sem desafio, e ensinar as crianças a serem consumidoras criteriosas e exigentes e a terem uma relação saudável com a televisão.

Por Ana Amaro Trindade, Psicóloga Clínica
Carolina N. Albino, Especialista em Ritmos de Sono do Bebé



Dias de excepção: A rotina e o sono


Mesmo com uma rotina ajustada e um trabalho privilegiado no sentido de orientar o bebé nos melhores hábitos, como ensinar a acalmar, a confiar, a dormir, comer bem, poderão surgir dificuldades em épocas festivas, que empurram só por si um ligeiro alterar de rota habitual. É um desafio, mas é bom saber que pode ser controlável!


Para cada vez mais Pais é notória a importância de uma rotina ajustada à idade e peso do bebé, no que toca ao sono e alimentação, para aquisição e consolidação de bons hábitos. É imprescindível que a rotina seja adequada, pois caso contrário, mesmo sem dias festivos e de excepção, o bebé poderá apresentar mais dificuldade em comer e dormir bem.
Então o que fazer? Os dias de excepção são geríveis! A primeira premissa está em si! Depende grandemente da vontade dos pais mostrarem ao bebé que o contexto, o lugar, as pessoas podem mudar, mas o resto é para manter (a base essencial).
 E como poderão fazê-lo? Orientando o bebé sob os mesmos intervalos de alimentação, colocando o bebé para dormir quando mostra sinais de sono, e comunicando com ele sob a mesma base de ligação que fazem quando estão em casa em dias normais. Certamente que poderá ser uma tarefa mais desafiante para os pais, que poderão estar mais desconcentrados, em viagem, etc, no entanto, são da maior importância situações como estas, quando se quer promover a consolidação dos melhores hábitos no bebé, em especial de sono- em qualquer lugar. Para um bebé podem bastar 2 dias de excepção seguidos à sua rotina para poder demonstrar sinais de “baralhação”, menos cooperação, mais dificuldade em acalmar.

Muitas vezes os pais questionam-me se a rotina do bebé é para pôr em prática em qualquer lugar. Absolutamente: convém explicar que a rotina do bebé não é algo acessório à sua vida, mas sim a melhor orientação que protege o bem-estar máximo do bebé, e como não podia deixar de ser, igualmente no campo do sono. Então orientar um bebé numa rotina é passível de fazer em qualquer lado: na casa dos avós, na rua, na praia, em viagem... Não será lógico que o bebé possa aprender que mesmo em locais diferentes, deve igualmente dormir e comer bem? Se para os pais isso é importante, é necessário então que possam ensiná-lo ao bebé, pois ele aprende exatamente aquilo que for ensinado.
Não é difícil fazê-lo de acordo com este mindset:
- Podem existir dias em que o bebé sai da rotina, seja por influência externa ou mesmo interna (do próprio bebé) - esta afirmação só se torna válida se os pais poderem controlar a quantidade de excepções que são aceitáveis para o seu bebé, e para tal é necessário conhecer bem o bebé, através de uma rotina ajustada torna-se mais fácil. Depois lembrar que depois de dois dias de excepção, ao terceiro o bebé poderá estar já baralhado.
- Poder de ajuste: é possível manter a rotina do bebé em qualquer local, bastando para isso condições mínimas (ter o que comer, e um sítio onde dormir seguro, e alguém carinhoso que o oriente) reproduzindo os rituais de forma similar ao que é feito em casa. Por exemplo, se em casa os pais usam uma música para o ritual de acalmar( antes de ir dormir), e ali não existe, os pais não devem temer essa falha, pois se mostrarem essa insegurança é normal que o bebé o sinta. Os pais devem fazer tudo o resto igual, mesmo sem a música, já que importa o conjunto de referências: falar mais devagar, enunciar certas palavras, mudar a fralda e oferecer a chucha, diminuir a luz, etc.( caso o ritual seja esse o normal antes de dormir)

- Horários de refeições: manter uma rotina em qualquer lado implica seguir os horários de alimentação. O seu bebé terá sempre que comer nos intervalos certos( nem seria justo não o fazer). Depois das alimentações, segue tudo com naturalidade - o momento em que o bebé está acordado em “actividade”. Depois do consumo de energia, que pode ser mais ou menos intenso, dependente do nível de intensidade do estímulo, o bebé dará os seus sinais de sono. Aí é importante que os pais possam reduzir o estímulo (ou limitando o campo visual, ou levando o bebé para um local mais tranquilo), e possam acalmá-lo antes de ir dormir através de um ritual que o promova, mas que possa ser o que o bebé conhece.

Para finalizar, é importante lembrar que os dias de excepção são isso mesmo, são dias excepcionais e como tal, não devem ser o padrão. Mas, se mesmo após um esforço consciente em manter tudo mais parecido com o padrão regular do bebé, as coisas saírem do controlo, seja por que razão for, deve usar-se de sensatez, pois uma situação de excepção poderá sempre ser corrigida no dia seguinte, e assim controlada uma nova e indesejada padronização.